Ricardo Pessoa: «Quero oferecer o Jamor aos jogadores»
O técnico Ricardo Pessoa marcou, ontem, presença nas instalações de A BOLA, nas Torres de Lisboa

Entrevista A BOLA Ricardo Pessoa: «Quero oferecer o Jamor aos jogadores»

NACIONAL28.05.202412:00

O treinador de 42 anos pegou no Lusitânia nos distritais e levou-o até à Liga 3 em apenas duas épocas. Em conversa com A BOLA, dá a conhecer a realidade do clube, as dificuldades de trabalhar em Angra do Heroísmo e confessa o sonho de marcar presença no Estádio Nacional, na final do Campeonato de Portugal

— Parabéns pela segunda subida de divisão consecutiva, desta feita à Liga 3. Qual é o segredo por detrás deste sucesso?

— É um projeto que tinha como objetivo tirar a equipa dos campeonatos distritais dos Açores e levá-la aos nacionais. Isso foi conseguido. Esta época, tivemos uma série de seis vitórias seguidas na fase regular do Campeonato de Portugal e entendemos que tínhamos capacidade para lutar por um dos dois lugares da fase de subida. Na fase seguinte, mantivemos a vontade de ganhar e fomos felizes no último fim de semana [o 1-1 com o U. Santarém valeu a subida].

Ricardo Pessoa não deixou nada por contar (A BOLA)

— No sábado, o Lusitânia está obrigado a vencer o V. Setúbal para chegar ao primeiro lugar...

— Não escondo que é um jogo especial. O da primeira volta [1-3] também o foi, porque regressei à uma casa onde me formei como jogador. Agora é a minha vez de os receber, mas quando o jogo começar vou defender os interesses do Lusitânia.

— Em caso de vitória, o Lusitânia irá disputar o título de campeão do Campeonato de Portugal no Jamor. Isso é o suficiente para motivar os seus jogadores?

— Está na cabeça de toda a gente. Era um prémio para eles, nem todos têm a oportunidade de jogar uma final no Jamor, independentemente do contexto. Vou trabalhar muito para poder oferecer esse presente aos meus jogadores e se isso acontecer quero que desfrutem. Como jogador, já tive a oportunidade de lá estar e ganhar uma Taça de Portugal ao serviço do V. Setúbal e sei o significado daquele estádio.

— O que levou a ir a treinar para os Açores?

— Eu tinha o desejo de ser treinador. Fui técnico-adjunto no Portimonense durante quatro anos, que me ajudaram bastante a perceber várias coisas. Agarrei-me a um projeto, que sabia que podia ser bom para mim e meti na cabeça que não podia falhar. Nestas divisões, se falhares praticamente hipotecas a tua carreira. Não senti essa pressão, isso até me motivou a trabalhar ainda mais. Como jogador, estive muitos anos na minha zona de conforto. Como treinador, tens de arriscar e percebi que não podes ter medo quando queres muito uma coisa.

— Chegou aos Açores em 2022. Quais as maiores dificuldades que sentiu?

— Quando me apresentaram o projeto foram bastantes honestos. Disseram-que teria de ser, muitas vezes, motorista, cozinheiro dos jogadores... Isso não foi problema para mim, porque o estou a fazer para os meus jogadores. Preparo-lhes um pequeno-almoço à profissional de futebol. As viagens também são um desgaste enorme. Saímos da Ilha Terceira de manhã e chegamos aos locais dos jogos apenas à noite. É chegar, comer e descansar para o dia seguinte. Queremos que o Lusitânia dê um passo em frente a nível estrutural para acompanhar o sucesso deportivo.

— Preocupa-o saber que poderá estar em dúvida a participação na Liga 3 na próxima época?

— Não, porque vamos cumprir os requisitos de licenciamento. Vamos mudar para um relvado natural no Estádio João Paulo II, mas aborrece-me que não possamos utilizá-lo todos os dias. No máximo, será uma ou duas vezes por semana e isto se não chover na Ilha Terceira. Não faz sentido andar em altos patamares e não haver pessoas que nos ajudem.

— Apesar destas condicionantes, pretende continuar no clube?

— Sim, até porque tenho contrato. Já estamos a trabalhar na próxima época, que vai ser complicada, com equipas históricas, como V. Setúbal, Académica e Belenenses. O objetivo passa pela permanência. Acredito no nosso trabalho.

O prazer de enfrentar o Benfica

Esta temporada, o modesto Lusitânia dos Açores recebeu o então campeão nacional Benfica, em outubro passado, para a 3.ª eliminatória da Taça de Portugal. Apesar da eliminação (1-4), Ricardo Pessoa recorda com carinho a experiência. «Aprendi que os meus jogadores não são inferiores na capacidade técnica. A nível tático, fiquei orgulhoso e tive o prazer de ver como eles entenderam o jogo. Depois, o Benfica jogou com quase todos os titulares, o que demonstrou um sinal de respeito para conosco. Fiquei feliz por ver a minha equipa a desfrutar e quero que trabalhem para existir mais jogos destes nas suas carreiras», sublinha o técnico, que confessa ficar impressionado com duas peças do onze habitual de Roger Schmidt. «O João Neves é raríssimo. Com pouco mais de 1,70 metros, distingue-se pela capacidade física, intensidade nos duelos pelo chão e no ar. O António Silva também marca a diferença pela capacidade de liderança e comunicação dentro de campo», elogia Ricardo Pessoa.

Ricardo Pessoa recorda jogo com o Benfica (A BOLA)

Portimonense no coração

Com mais de 400 jogos pelo Portimonense, Ricardo Pessoa mostrou-se confiante para a segunda mão do play-off de permanência, depois da derrota (1-2) dos algarvios no primeiro jogo ante o Aves SAD, da Liga 2.
«Acredito que vamos vencer lá. Sou adepto e não quero que eles desçam de divisão», deseja o treinador, que não esconde o querer de um dia orientar o emblema algarvio ou... o Vitória de Setúbal. «Eu tenho 42 anos e quero treinar durante mais vinte e irei conseguir treinar um deles.» Fica a promessa.

Ricardo Pessoa foi futebolista do Portimonense e realizou mais de 400 jogos pelos algarvios (ASF/CARLOS VIDIGAL JR)